terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Amor estranho


Corpos que se encaixam e se repelem.
Almas que se abraçam. Conforto que comprime.
As pernas se misturam, os pés se entrelaçam, mas as mãos
estão atadas.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Tchau, docinho de leite


O amor não é uma coisa incondicional, ou pelo menos não deveria ser. Na verdade é, e é tão lindo isso, mas a vida tem me mostrado que não se deve pensar assim. “Carol, seja mais realista! Carol, para de acreditar em Disney! Carol, isso! Carol, aquilo!” Então tá certo. Amor demais é exagero. E vem acompanhado de exageradas expectativas. Mas, cortam-se as expectativas, corta-se o amor.

Expectativa é uma coisa muito fantasiosa. Deve ser evitada, ou ao menos reduzida ao básico: o cuidado. Pois cuidado é instintivo.

É muito triste testar o amor, o amor nunca deve ser testado, isso é realismo demais para alguém tão emotiva. Eu não, eu acredito, eu espero. Mas a vida insiste em ser real, e ela joga isso na sua cara, as pessoas jogam, não tem saída.

Ela provoca um acidente e te diz: olha aí sua fantasia indo embora com a correnteza...

Tchau, docinho de leite!

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Tutorial


Como se curar de uma desilusão amorosa:
  1. Vá até a cozinha
  2. Abra a geladeira
  3. Coma tudo que tiver de bom
  4.  Saboreie sem pena
  5. Imagine que parar ficar com essa pessoa você precisaria parar de comer
  6. Vá dormir feliz sabendo que também não deixaria de dormir por ninguém


terça-feira, 6 de novembro de 2012

Usar localização atual? Sim, por favor.


Está tão silencioso que ouço o pulsar de minhas carótidas. É um pulsar que arde. Arde como essa lembrança. Está tudo acontecendo novamente. A esperança, a fantasia, e esse ardor. É um ardor quase bom, mas dói demais. Ai, dor...

Sinto como se essas memórias não pertencessem a mim. Mas não pretendo devolvê-las. Posso ficar com elas mais um pouco? Eu praticamente as inventei mesmo...

Então eu lembro que eu já estive nessa rua. Sei onde vai dar. Já conheço o caminho, não tem saída. Não quero ir até o fim de novo. Melhor dar meia volta. Continuar para que? Não tem nada lá.

Mas fico lá paralisada. Olho para trás, um borrão. Olho pra frente, nada enxergo.

Melhor procurar outro caminho. Eu deveria até comprar um GPS. Tudo que preciso é me localizar. E de preferência, aqui. Que é onde estou.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Just a daydream


Não há nada mais patético que ficar completamente encantado por alguém. E é patético porque isso nunca ocorre de forma recíproca, e mesmo assim a pessoa fica numa esperança irracional. Fica se enganando, achando que qualquer migalha de atenção significa alguma coisa grandiosa. Mas não significa nada! Absolutamente nada. Digo isso porque já estive dos dois lados da moeda. E não é fácil pra nenhum. Mas eu particularmente prefiro estar no lado patético. Não gosto de me sentir responsável pela frustração dos outros. E não sou, nem ninguém é. Aliás, cada um com a sua. As minhas eu supero bem, um mês depois, três meses ou dois anos depois, mas supero. O negócio é que não tem saída, melhor mesmo é aceitar a patetice e vivê-la até o fim. Mas com sensatez!

Imaginar que uma coisa é sua não é o mesmo que tomar para si. Somos todos egoístas. Mas é preciso ser sensato até aí. Às vezes me pego desejando algo que se realmente acontecesse, não seria legal para alguém. Paciência... para mim! Que não posso fazer nada. O mundo não é meu e nem a minha força do pensamento pode mudar o destino. E se pudesse, eu não o faria mesmo, não seria honesto. Nem com os outros e nem comigo, porque não é isso que eu quero: poder mudar as coisas. Minha fantasia é que as coisas mudem misticamente. O que apesar de fantasiar, eu nem acredito.

Então já que é assim, que mal tem fantasiar um pouquinho? Estou fantasiando que hoje eu não tenho que fazer nada, e que fantasia gostosa! Mas isso não vai me impedir de ir resolver as coisas. Da mesma forma, se eu quiser fantasiar um amor, isso é um problema meu. Isso me impede de encarar a realidade? Não. Isso me faz sofrer? Tanto quanto saber que hoje eu tenho obrigações e minha fantasia de ficar em casa fazendo qualquer outra coisa ou apenas com a bunda pra cima não será realizada. Como diria Tania Christal e Numa Ciro: “Ai como é bom viver uma ilusão sem nenhuma consciência ou razão”.

Patético ou não, é inevitável passar por isso. Na verdade, tentar evitar isso é se privar de uma ilusão gostosa que no final todo mundo sabe que não é real, mas e daí? É uma delícia! Depois todo mundo cai na real, a vida continua e todo mundo sobrevive. Nem Adele morreu de amores! Agora vou encerrar aqui porque estou fantasiando uma coisa que eu tenho o poder de fazer acontecer, e essa coisa é um lanche. E daqueles! Sem me importar com as calorias ou com a balança. Parafraseando Los Hermanos, “eu sei, não é assim, mas deixa eu fingir e rir”... 

domingo, 21 de outubro de 2012

A Pequena Sereia e a verdadeira história do amor


Quem não assistiu a esse filme “infantil” e não se encantou completamente pela história dessa jovem sonhadora que vai atrás do amor sem pensar nas consequências? Sim, infantil entre aspas, porque apesar de ter um final feliz, é completamente irreal, e isso tem ficado no inconsciente das crianças, que quando crescem podem vir a buscar por uma coisa que não existe. Estou me referindo à versão da Disney, não à original de Hans Christian Andersen, que apesar de mais realista por um lado, por outro é bem macabra, o que quase não se pode considerar um “conto de fada”. Se esse filme influenciou e influencia alguém até hoje eu não sei. Mas para o bem ou para o mal, o simbolismo presente nesse filme é muito marcante. 



Eu mesma só vim a perceber isso tão claramente recentemente. O filme é de 1989, ou seja, eu tinha dois anos quando foi lançado, e (perguntem para minha mãe), foi o filme que eu mais loquei na minha infância. Eu sabia todas as falas e músicas decoradas (e sei até hoje). Não posso negar que até meu cabelo de ruivo pintei inspirado na sereiazinha durante a minha adolescência, coisa que recentemente voltei a fazer, talvez pelos mesmos motivos de antigamente. E vai saber se influenciou em outras coisas também.

Mas vamos ao que interessa: Ariel é uma sereia de 16 anos, filha de Tritão, rei dos mares, possuidora da mais bela voz de todo o mar. Fascinada pelo mundo dos humanos, ela se apaixona pelo príncipe Eric, ao salvá-lo do afogamento. Ela canta para ele, mas fica com medo e foge antes que ele acorde. Eric também é um jovem sonhador, que fica obcecado por aquela voz, e jura que irá casar com a dona dela. Ela está tão cegamente apaixonada que faz um pacto com a bruxa do mar para se tornar humana e ficar com seu príncipe, dando sua voz em troca pelas pernas. Ela possui apenas três dias para conquistar o príncipe (ele deve beijá-la), ou então pertencerá à bruxa. Tarefa difícil, pois ele se encontra apaixonado pela dona de uma bela voz, coisa que ela não mais possui, não podendo contar a ele que foi ela quem o salvou. Nada mais a resta além de esperança. Claro que ocorrem reviravoltas “disnianas”, ela recupera a voz, ele descobre a verdade e eles ficam juntos, felizes para sempre.

Na versão original, ela não tem essa mesma sorte, o príncipe a acolhe, mas a vê como uma boa amiga, continuando apaixonado e obcecado pela voz que o salvou, mas no fim se convencendo que isso não é real e casando com uma outra moça, de carne e osso, bonita, de boa família, que poderia ser boa mãe, e tudo o mais de racional que pudesse favorecer essa união. A pequena sereia então estaria condenada a virar espuma do mar caso ele se casasse com outra, que é o verdadeiro final dessa história. Fantasias à parte, ela se arromba! E, quem já sofreu alguma desilusão amorosa sabe que o sentimento é exatamente esse. A pessoa desiludida se sente reduzida ao nada, tendo que achar um novo sentido para sua vida, muitas vezes em casos extremos, não encontrando nunca mais, simbolicamente interpretado como a morte para Andersen.

Por outro lado, o amor de Ariel por seu príncipe é lindo e genuíno. É um sentimento de total entrega e necessidade de cuidar do seu objeto de desejo, que muitas pessoas vão passar a vida inteira sem experimentar. E quem já sentiu isso uma vez sabe que um encantamento assim raramente se repete, ou pelo menos não tão intensamente. Em se tratando do sentimento de Ariel, os roteiristas da Disney se inspiraram totalmente na versão de Andersen, na qual o sentimento da jovem sereia é puro e talvez o fascínio seja ainda maior justamente por ser um amor platônico e impossível. E é aí que a perda da voz é algo muito simbólico, pois Ariel fantasia uma relação com o príncipe que não existia, e vai atrás dessa sua fantasia no silêncio, tendo apenas consigo uma esperança que em nada se podia palpar. No seu caso, sua voz a libertaria, pois se o príncipe soubesse que era ela quem ele estava procurando, ele certamente a aceitaria (nessa história em particular). Mas simbolicamente, o fato de não falar faz com que a fantasia permaneça inalterada por mais tempo, uma vez que ao nos manifestarmos podemos obter uma resposta contrária a que esperamos, por parte do objeto de desejo. E apesar de no fundo Ariel saber que existe a possibilidade de seu ato de entrega e coragem não dar certo, ela ainda assim toma essa decisão, pois a vida não valeria a pena sem amor.


Nesse aspecto, os roteiristas não são nada originais, e não me detenho a criticar o fato de Ariel amar o príncipe dessa forma. Várias são as histórias que abordam o amor como um martírio, sendo a mais famosa delas Romeu e Julieta, símbolos do amor genuíno, pois morreram jovens, sem ter passado pelas adversidades da vida a dois, que muitas vezes massacram esse sentimento. O que me pergunto é se as crianças devem crescer com essa referência do amor. Se é que isso realmente influencia na nossa busca pelo amor, ou se isso já faz parte da condição humana há muito mais tempo. Porém, no caso do filme da Disney, essa referência possui um final feliz que na grande maioria das vezes, não chegará nunca.

Longe de mim dizer que ninguém nunca vai ser feliz no amor. Mas a busca por esse arquétipo do amor impossível que por consequência do destino virá a ser concretizado é uma busca frustrada, eu diria que sempre. Se o “conto de fada” da pequena sereia fosse reescrito de forma moderna e realista, acabaria na cena épica em que Ariel chora no píer ao se deparar com a realidade e a rejeição. E aí com o tempo, ela superaria e encontraria outra pessoa, mais real e acessível, e viveria um amor talvez menos emocionante, mas possível. E é aí que eu me pergunto se esse dilema realmente existe ou se ele é implantado nas nossas mentes por histórias como essa e tantas outras. Que o amor verdadeiro e emocionante dói e não dá certo, e o que daria certo, no caso, não causaria sofrimento, porém não seria amor verdadeiro. Será que Vinícius de Moraes estava certo ao dizer que “o amor só é bom se doer”?



Estou certa que algumas pessoas que vão passar a vida inteira sem experimentar esse sentimento de entrega a alguém, e vão se relacionar com pessoas por outros motivos, vontade de constituir família, medo da solidão, ou simplesmente necessidade de se relacionar sexualmente, o que não quer dizer que serão infelizes por isso.  E outras vão experimentar e vão sofrer muito com a dura realidade, e talvez se juntem ao primeiro grupo, ou ficarão frustradas para o resto da vida. E outras (não descarto essa possibilidade) ganharão na megasena do amor e vão amar como Ariel, e ser completamente correspondidas por seus respectivos Erics.

Será que nós fomos influenciados pelos finais felizes de contos de fadas e filmes água com açúcar, ou isso é inerente ao ser humano, de se interessar pelo mais difícil (claro que uns muito mais que outros)? E se deixarmos nos influenciar por Ariel é uma coisa boa eu não sei, na verdade eu luto contra o fato de que devemos nos contentar com algo menos emocionante, porém real (talvez a Ariel já seja até meu alter ego!). O que sei é que é preciso se lembrar de que nossa vida não é escrita por roteiristas da Disney.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A doença do sonho


Esperança é o ato de esperar. É dormir e torcer pra quando acordar, o sonho estar lá. Esperança é não querer acordar nunca, porque sabe que o sonho não vai estar lá. Esperança é a doença do sonho. O doente é o sonhador.

Esperar é resignar-se heroicamente em silêncio, pois qualquer som emitido faz o sonhador acordar, desvanecendo a fantasia. Esperar é viver internamente. É saber que sua cura é simplesmente abrir os olhos, e mesmo assim preferir mantê-los cerrados.

Quem espera não tem coragem, pois a coragem caminha lado a lado com a realidade. Quem espera não faz nada. Quem espera anda em círculos. Dá uma volta inteira no relógio, e vinte e quatro horas depois está no mesmo lugar.

A realidade é o pesadelo de quem sonha, mas é também o seu remédio. Porém, o sonhador não quer curar-se.

Uma vida inteira em pensamento, fim de quem tem esperança.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Egoísmo sensato


Eu não sou a melhor pessoa do mundo para se apaixonar. Mas apaixonada eu sou a melhor pessoa do mundo.

Não sei lidar com a paixão alheia. Não me dê seu coração, pois não saberei o que fazer com ele. Guardar? Colocar numa estante, num cofre? Deixar jogado na bagunça do meu quarto? Não sei. É capaz até de eu tropeçar nele uma ou duas vezes, sem querer. Eu só sei lidar com o meu coração, e eu o guardo comigo sempre, no meio da bagunça mesmo, ele já está acostumado. Não dou pra ninguém, eu que sou a responsável por ele. Mesmo quando ele quer bater mais forte. Principalmente quando ele quer bater mais forte.

Ah, mas apaixonada eu faço tudo, sem pedir nada em troca. Eu tento ser a medida certa, nem mais, nem menos. Sempre compreensiva e nunca sufocante. Extremamente cautelosa, e ao mesmo tempo tão entregue. Tudo que parece perfeição, mas no fundo é egoísmo.  Mas egoísmo sensato. Ser perfeita para alguém, para nunca ser abandonada. E ser uma pessoa melhor não me parece uma coisa tão condenável.

Acontece que vez ou outra alguém gosta de você no meio de todos os seus tropeços. Com toda a sua frieza e falta de romantismo. E aí? O que fazer? Ficar presa entre o “essa sou eu de verdade, devo valorizar isso porque aquela é pura falsidade” não vai levar a nada. Tudo bem que a dualidade é nítida, e a falsidade é sugestiva. Mas pelo contrário, vejo isso como autenticidade. Porque eu não me vejo acordando ao lado de ninguém, adoro dormir esparramada. Agora quando eu me vejo... é porque já estou completamente entregue, e é assim que eu penso que o amor deve ser. Uma coisa inesperada, um encantamento, e não um jeito de ser.

Acho engraçada essa coisa da ousadia. Essa coisa de dizer: fulana (o) tem atitude. Atitude é pra quem não tem nada a perder. Jogo de conquista é pra quem não tem nada a perder. E quem está apaixonado mesmo tem tudo a perder. Um passo em falso e tudo está perdido. Por isso a questão de tentar ser perfeito para alguém. Sim, claro que não deixa de ser egoísmo querer fazer tudo “certo”, pois no fundo o objetivo é não ser abandonado. Mas isso não invalida nada do que se fez. Porque pouco importa se será abandonado ou não, faz do mesmo jeito. Porque o amor mesmo tem sempre um quê de perdido.

E na verdade, ninguém quer ser amado, quer apenas amar.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Deixar de lado


Não tenho medo de entrar na vida das pessoas. Eu sempre acho que as pessoas vão me achar legal, e claro, se me derem abertura para isso, não terei receio nenhum em ser eu mesma perto delas. Sempre acho que vão achar o meu papo interessante, minhas piadas engraçadas, e meu jeito avoadinho fofinho. Mas é claro que nem todos pensarão assim. Existem certas pessoas que você encontra pelo caminho que em algum momento te travam. Não estou querendo falar das pessoas que você mal se envolve na vida. Estou falando daquelas que te despertam muita atenção, mas mesmo assim o envolvimento é difícil. E então você começa a se questionar se o seu papo é bobo, se suas piadas são sem graça, e se seu jeito avoadinho é irritante. Aprendi que se você está se sentindo assim, geralmente é porque elas estão pensando isso mesmo. Isso porque a gente só dança com quem sabe dançar. Se as coisas estão tão fora do ritmo assim, a culpa não é só sua. E então é hora de deixar de lado. Mas o difícil é conseguir isso.

Às vezes você gosta tanto de alguém, mesmo que de longe, mesmo sem conhecer tanto, simplesmente por gostar. E a vontade é de cuidar, pra que nenhum mal aconteça a essa pessoa. E não é um gostar fantasioso. Sim, eu tendo a fantasiar demais minhas relações com as pessoas. Sempre. Mas, não sou de me frustrar com a realidade. Aprendi que devemos aceitar apenas o que as pessoas podem nos oferecer, e ficar contentes com isso, pois é espontâneo. E dessa forma, há pessoas que não precisam fazer nada para gostarmos delas. Gostamos porque são elas, sem mais explicações. Porém se sente que não é bem vindo. Mas você se esforça para pensar que é imaginação sua, insegurança mesmo e que não tem nada a ver com as atitudes dessa pessoa. Em vão. Por quê? Por que você não gosta de mim? Por que não quer minha amizade? Tudo passa pela cabeça.

Eu gostaria tanto de pensar que quem não gosta de mim é quem perde. Seria tão mais fácil pensar dessa forma. Tudo se resolveria com esse simples pensamento. Que bobo... Nem sabe o que está perdendo... Mas eu não penso assim. Sim, no meu mundo eu sou a protagonista, mas sei que existem bilhões de outros mundos, que mal sabem da existência do meu. Seria tão fácil a cada desilusão amorosa pensar: nunca encontrará alguém que goste tanto assim como eu gosto. Mas vai encontrar. Nunca achará alguém que o compreenda melhor. Só que vai. Ou alguém que seja tão divertida, inteligente ou até tão bonita. Mas vai achar uma mais bonita ainda. Porque tudo isso são coisas que dependem da interpretação do outro. E o imaginário de alguém é um campo ao qual ninguém de fora tem acesso.

Deixar de lado é uma das coisas mais difíceis que eu aprendi na vida. Mas deixar de lado não quer dizer colocar um ponto final. A vida é cheia de surpresas e oportunidades e estar aberta a elas é outra coisa que aprendi.

Deixar de lado significa reticências. Significa entrar em casa para se abrigar e fechar a porta. Mas deixar a janela aberta...

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Mixed up in a highball glass filled with ice


Minha emoção vem em doses.

Uma dose de emoção, por favor?

Aproveite sua viagem no parque de diversões, senhorita! Diz o bilheteiro.

Não quero ir embora, mas os portões estão fechando. Preciso ir. Mas tudo bem, porque a emoção ainda está aqui, os efeitos dela permanecem. Quase não percebo que dos portões pra fora é um caminho sem volta. Acabo indo. Não tenho escolha.

No dia seguinte, acordo. Um sabor cítrico e levemente etílico ainda me inebria. Lembro-me da montanha russa. Roda gigante. Lá em cima. Sem pensar no futuro. Mas então me lembro de que isso já aconteceu. Foi ontem, e já é hora de olhar para frente.

E com o tempo a meia vida da emoção acaba. Excreção renal da emoção. Dosagem sanguínea de emoção indetectável.

Começam os sintomas de abstinência, quero outra dose. Mas o parque fechou. Não é temporada de parque na cidade.

Vem alguém e pergunta: quer infusão contínua de emoção altamente diluída em gotejamento lento?

Não, obrigada. Outra dose. E agora me vê dupla.

domingo, 29 de julho de 2012

O que não faz sentido


O sentimento é por natureza irracional. Tem vontade própria, e é insistente: chega antes da razão, e vai embora depois. A razão pensa, pondera o que é melhor, e deixa uma carta explicando tudo minuciosamente. Ele lê, chora e rasga a carta. Finge que nem leu.

A razão pergunta, indignada:

- Por que você não faz o que eu permito? Quer se machucar?

Mas o sentimento responde:

- Se eu fizesse o que você deixa, eu teria razão. E se eu tivesse razão, seria pensado e não sentido, o que não faria sentido. E afinal, qual seria a graça se você permitisse?

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Das vantagens de ser besta


Sem querer confrontar Clarice Lispector, ser bobo tem suas vantagens, mas bom mesmo é ser besta. O besta nada mais é do que um bobo. É um tipo de bobo. Tem todas as características do bobo, que como Clarice bem disse: não é um burro. O besta não precisa de muito para se divertir. Para ele as maiores alegrias estão nas pequenas coisas. 

O besta na maioria das vezes é distraído, consegue passar horas olhando para o tempo e ele só se dá conta que alguém chamou por ele quando a pessoa já está gritando seu nome. O besta também cai no chão com facilidade, e não hesita em rir de si mesmo quando isso acontece. Ele até prefere que caso presenciem o fato, riam junto com ele. 

O besta se dá bem com cachorros e crianças. Os cachorros ganham vozes perto do besta. Isso porque ele não pode ver um cachorro que começa a “dublar” seus pensamentos. O besta conversa com as crianças como se elas fossem adultas. E elas conversam com ele como se ele fosse criança.

O besta imagina as situações mais absurdas e fica rindo sozinho, sem se preocupar com os olhares repressores. O besta ri dos olhares repressores. O besta ri de si mesmo. O besta ri várias vezes da mesma piada e quando alguém pergunta se conhece tal piada, até finge que nunca a ouviu, só para ouvir de novo e poder rir mais. O besta até prefere as piadas “sem graça”, não por dificuldade de entender as piadas e sim por dó da piada, porque ninguém ri dela. O besta geralmente possui uma risada engraçada. As pessoas costumam se contagiar quando ele começa a rir.

Mas também há desvantagens. O besta não consegue segurar seu riso. O que pode o colocar em situações constrangedoras. Ainda mais porque o besta possui dificuldades em se manter sério em situações em que a sociedade exige seriedade.

Aviso: não confundir besta com abestalhado. O besta não ri de tudo. A risada do besta se dá pela linguagem, pela graciosidade, não só por ver graça em tudo sem critérios.

O besta chora de rir e se emociona com facilidade. Mas ele não está feliz sempre, quando está triste as pessoas percebem logo. Fingir que está feliz não é uma coisa que o besta consegue fazer muito bem. O besta não segura o choro, quando ele chora é de soluçar.

O besta é lúdico, não infantil. E como ri! Só o besta é capaz de excesso de risada. E só o riso faz o besta.

domingo, 15 de julho de 2012

O momento


Não estou pronta para dizer adeus. Até mais, então. Não sei se serei a mesma até lá. Esse brilho que agora é intenso pode ser apenas uma tênue luz quando chegar o momento. Não acredito em destino. Não acredito em alma gêmea. Mas acredito no momento. O momento é o dono da vida. O momento faz com que situações aleatórias sejam interpretadas como destino, e pessoas compatíveis como almas gêmeas. Mas é difícil não interpretar dessa forma, mesmo sabendo que há sete bilhões de pessoas no mundo. Isso implica em haver pessoas compatíveis por todos os lados. Mas momentos compatíveis não, por isso todo esse misticismo por trás deles. Momentos compatíveis são raros. Porém cada momento é individual e único. E momentos devem ser respeitados.

Não gosto de joguinhos. Não tente me interpretar, pois nada do que faço é esperando alguma reação. Tudo em mim é verdadeiro, até mesmo a minha forma de não agir. Fiz tudo que estava ao meu alcance, e vivi, cada instante. Agora é com você. Não por orgulho, nem por ser sua vez no jogo. Não há jogos. Apenas por questão de respeito. Você não merece que eu despeje todo meu sentimento sobre você, é muita responsabilidade. Não, isso é só meu. Deixa que eu cuide disso. Não é que eu tenha medo da queda. Muito pelo contrário, já dei minha cara a tapa há muito tempo. Mas não sei do seu momento. Eu só sei do meu, e quando ele chegou me joguei sem hesitar. Se eu soubesse que o seu momento é igual ao meu, eu estaria aí, e não aqui olhando para o relógio. Mas enquanto não sei, espero.

Não quero que esse momento acabe. Quero que ele ainda esteja aqui quando você chegar, se você chegar. Mas não posso garantir nada. Não sou dona do momento, ele que é meu dono. E o que ele manda eu faço. Já não sei se estou tentando fazer com que o momento espere um pouco mais, ou relutantemente querendo acabar de vez com ele por não suportar a espera. Mas é inútil, quando ele quer ele é avassalador. E ele não quer dizer adeus.

Até mais.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Manias comprometedoras


Tenho o estranho costume de observar os motoristas dos carros ao lado, quando o trânsito está parado. A inquietude é quase geral, mas incrível mesmo é o fato de as pessoas não se lembrarem de que podem estar sendo observadas quando estão em seus carros nos engarrafamentos. Eu mesma estou com a agenda cheia de tanto show que tenho realizado no meu carro. O playback rola solto, e videoclipes, já tenho vários gravados! Vez ou outra alguns passageiros de outros veículos ficam meio chocados com as performances. E quando me dou conta que estou sendo observada caio na gargalhada.

Mas isso não é nada perto do que eu constatei hoje: ainda há pouco passei uma hora no trânsito voltando para casa e descobri que colocar o dedo no nariz é quase um fenômeno em massa. E é contagioso! É só um começar que se dá início a um efeito dominó de cutucadas nasais. E quanto mais parado o trânsito pior. Será que o tédio tem algo a ver com a vontade de colocar dedos em orifícios corporais? E os orifícios não param nas narinas! Algumas pessoas são mais ousadas e ainda se atrevem a saborear o produto interno bruto...

Fiquei imaginando se houvesse uma infração de trânsito por colocar o dedo no nariz, já que imaginar situações absurdas também é um costume esquisito que tenho. Bem, teoricamente você não pode dirigir com distrações e brincar com bolinha de meleca poderia muito bem se enquadrar nessa categoria. As pessoas seriam paradas nas blitz, e receberiam multas por serem flagradas com a boca na botija (ou seria o dedo?), tentando se explicar: “mas seu guarda, por favor, essa era enorme, eu mal estava conseguindo respirar!”. Mas o guarda diria que não é ele quem faz as leis. Então o motorista teria que entrar com recursos, alegando não poder dirigir com déficit de oxigênio no cérebro. E haveria uma perícia especializada em determinar se o diâmetro da catota poderia ou não causar uma obstrução das vias aéreas do cidadão.

Até que o sinal abriu e simplesmente aumentei o volume do meu som, e segui cantando, discretamente, por via das dúvidas. E decidi parar com essa mania de olhar pros lados antes que isso ou algo mais bizarro me contagiasse e pudesse me comprometer também.

domingo, 8 de julho de 2012

O metrô


Havia acabado de sair do show do Noel Gallagher em São Paulo. Era meia noite e fazia um frio de 18° na Barra Funda. E a galera ainda eufórica gritava no caminho do metrô: “olé, olé, olé, olé, Noeeel, Noeeel!”. Pegamos o metrô, eu e um casal de amigos. Linha Vermelha. Próxima parada: República. Na República, me despedi dos meus amigos para fazer a baldeação com a Linha Amarela. Entrei no trem, me sentei sozinha, aguardando a estação Paulista. Fiquei observando as pessoas ainda comentando sobre o show e no quão incrível havia sido. Havia um rapaz perto da porta, aparentemente de uns 20 e poucos anos, alto, cabelos escuros, com uma grande, porém discreta e linear cicatriz na bochecha esquerda. Fiquei intrigada com o que poderia ter causado aquela cicatriz, e ao mesmo tempo admirei. Pensei “tem cicatrizes que realmente deixam a pessoa charmosa”. Fiquei o observando enquanto conversava com dois amigos sobre o show. “Hum, então ele estava no show...”. Fiquei observando seu jeito, suas feições, e me encantei. Uma daquelas paixõezinhas anônimas platônicas. Um rosto na multidão. Um passante de Baudelaire.

Estação Paulista. Fui andando em direção à saída para pegar o táxi com destino ao local onde estava hospedada, na avenida Rebouças. A estação já estava um pouco deserta e as únicas pessoas que estavam fazendo o mesmo caminho que eu eram três rapazes, entre eles o rapaz desconhecido do trem. Subimos a escada rolante, enquanto um deles subiu pela escada normal. O rapaz da cicatriz prontamente exclamou: “Véi! Por que você está subindo de escada? Você é burro? Vai ter que tomar banho quando chegar em casa!” e estranhamente se virou pra mim (isso mesmo!) e disse “não é?”. Fiquei tão surpresa que mal consegui dizer: “lógico... eu não vou tomar banho agora, você vai?”. E ele respondeu: “só amanhã cedo!”. Então emendei: “vou tomar amanhã tarde, pois pretendo dormir muito!”. Ele riu, dizendo aos amigos “gente, ela é das minhas!”.

Já na avenida Consolação (que é uma continuação da avenida Rebouças, para onde eu estava indo) pensei em pegar um táxi, mas não havia nenhum, e os rapazes estavam indo ao ponto de ônibus. Resolvi acompanhar, pois pensei que alguém que está saindo do show de Noel Gallagher deveria ser, no mínimo, um pouco confiável. O ônibus não demorou nem cinco minutos. Subi, paguei ao cobrador e fui apreensivamente para a saída, pois o meu ponto não ia demorar. Olhei ao redor e para minha (boa) surpresa, o rapaz desconhecido do metrô também estava lá. Ele olhou para mim e acenou com a cabeça, sorrindo. Sorri de volta, com timidez. Até que chegou a minha parada. Olhei novamente para ele, mas ele estava conversando com seu amigo. Desci, e ao esperar o sinal abrir para os pedestres, olhei mais uma vez para dentro do ônibus, na esperança de vê-lo uma última vez. Ele olhava ao redor como se procurasse algo, até que olhou para a calçada e me viu. Ao me ver, sorriu, como quem se despede. Um sorriso de indignação, como quem diz “não nos veremos nunca mais?”. “Não”, pensei. E eu sorri de volta, ainda me contendo da emoção do momento, com um misto de arrependimento por não ter perguntado seu nome, e ao mesmo tempo encantamento pelo anonimato dessa paixão, que nunca se realizará.

”A rua, em torno, era ensurdecedora vaia.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão vaidosa
Erguendo e balançando a barra alva da saia;

Pernas de estátua, era fidalga, ágil e fina.
Eu bebia, como um basbaque extravagante,
No tempestuoso céu do seu olhar distante,
A doçura que encanta e o prazer que assassina.

Brilho... e a noite depois! - Fugitiva beldade
De um olhar que me fez nascer segunda vez,
Não mais te hei de rever senão na eternidade?

Longe daquí! tarde demais! nunca talvez!
Pois não sabes de mim, não sei que fim levaste,
Tu que eu teria amado, ó tu que o adivinhaste!”

A uma passante, Charles Baudelaire.