quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Protótipos de amor em cápsulas


Num futuro não muito distante, um senhor já de idade se prepara para abrir sua cápsula do tempo. Já é hora, ele pensa. Ou então morrerá sem provar dos encantos que ele guardou. Vê, nessa época isso é uma coisa muito comum, e as cápsulas do tempo são muito espaçosas. Cabe tudo que você quiser colocar. Cabe todos os seus sonhos. Todos os seus amores. E foi isso que esse senhor colocou. Um amor. E com ele, todas as suas esperanças e sonhos de outrora.

Quando ele era mais jovem, ele tinha um amor tão delicado, tão puro, que ele resolveu guardar. E então ele guardou. E quem guarda não esconde. Quem guarda não perde de vista. Então ele guardou ali mesmo, tão junto, tão perto, apenas um vidro o separava de ter o seu amor nos seus braços. Tantas vezes ele se aproximou ofegante, deixando o vidro embaçado. Estava muito perto e ao mesmo tempo muito inatingível. As pessoas tentavam se aproximar e ele as afastava. A cápsula tanto impedia que ele chegasse perto, quanto a outras pessoas que passavam e se interessavam. Olhavam a vitrine e diziam:

- Que lindo! É seu?

- Não, não é meu. E nem é lindo. É estranho.

- Então posso pegar para mim?

- Não sei por que você poderia querer uma coisa dessas.

- É verdade, obrigado.

- Disponha.

Ele repetia tanto isso que chegava a acreditar. É, talvez seja muito estranho mesmo, ele pensava. Mas essas cápsulas eram ultra modernas, ele sabia disso. Elas modificavam o conteúdo de acordo com os seus desejos. Mais reto, mais curvo, pontiagudo, arredondado nas quinas, alongado. Agora deve estar como eu quero, ele pensou enquanto se aproximava para abrir a cápsula.

Ele, durante a juventude, contava tudo para o seu amor através do vidro. Todos os dias ele sentava na frente da vitrine e ficava contando sobre todas as suas conquistas. E seu amor só escutava, nada podia fazer, pois estava preso à cápsula. Mal via a hora de sair para estar perto dele, mas todos os dias o senhor se aproximava e contava que estava perto de outras pessoas agora, vivendo outros tipos de romances, mas que um dia estaria perto do seu amor. Agora não podia, o amor ainda precisava de adaptações. E seu amor entendeu.

E quando chegou o grande dia, ele finalmente abriu a cápsula. Mas para sua infeliz surpresa, seu amor estava completamente deformado, agonizando quase morto. Acontece que ele desejou tanto que o amor se moldasse ao que ele queria que com o tempo, foi isso que aconteceu. E aos seus olhos estaria perfeito. Mas ele demorou tanto tempo parar abrir a cápsula, que o amor continuou sendo modificado até que ficou desfigurado, já quase nem respirava. Além disso, a atmosfera do futuro era diferente e seus pulmões não estavam adaptados.

O senhor, em prantos, pensou “só queria meu amor como ele era antes!”. E enquanto isso, ele tentava se aproximar para ouvir os últimos murmúrios que saíam daquele corpo anômalo...

“Sempre te amei”

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